Em pouco mais de uma década, formalização e escolaridade do trabalhador avançam

Apesar da melhora, especialistas apontam gargalo da baixa produtividade

POR FABIO VASCONCELLOS

RIO – A melhora nos níveis de formação da população na última década e o crescimento econômico se refletiram no perfil do trabalhador brasileiro. Prorrogamos um pouco mais a entrada no mercado de emprego, temos mais anos de estudo, melhor renda e mais carteiras assinadas. Embora o 1º de maio de 2015 não seja dos mais promissores dos últimos anos — o IBGE registra crescimento do desemprego e queda do rendimento — os dados da série histórica da Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (Pnad) para o período de 2001 a 2013 indicam que, ao olhar no retrovisor, o trabalhador brasileiro tem o que comemorar, apesar dos enormes desafios pela frente, como a baixa produtividade.

Talvez uma das mudanças mais expressivas do perfil do trabalhador tenha sido nos níveis de escolaridade. Em 2001, a maior parte daqueles com alguma ocupação tinha entre 4 e 7 anos de estudo (29%). Aqueles sem qualquer instrução chegavam a 17%. Onze anos depois, a proporção de trabalhadores sem instrução caiu dez pontos percentuais. Em 2013, a maior proporção está na faixa dos têm entre 11 a 14 anos de estudos, que subiu 19 pontos percentuais, atingindo 36%. Houve um crescimento também entre os que estudaram mais de 15 anos. No início da série eles representavam 6,6% e passaram 13%.

Quando comparado por gênero, a faixa dos trabalhadores mais escolarizados mostra que as mulheres se destacam. No início dos anos 2000, a participação de homens e mulheres no grupo dos profissionais com mais de 15 anos de estudo estava na faixa dos 3%. Pelos dados da Pnad, as mulheres passaram os homens em 2002 e, em 2013, representavam 7% dos mais escolarizados. Os homens também ampliaram o percentual, porém, num ritmo bem mais lento: 5%.

Para especialistas, o saldo dessas mudanças no perfil do trabalhador foi a melhora no nível de formalização do emprego e de renda. Pela série da Pnad, havia cerca de 54% de trabalhadores com carteira assinada em 2001. Esse percentual cresceu continuamente até atingir, em 2013, o patamar de 64%. Os sem carteira assinada caíram de 33% para 23%.

— Sem dúvida, temos nesse período uma melhora importante no perfil do trabalhador, sobretudo com relação à formação escolar. Apesar do aumento registrado este ano, temos uma taxa de desemprego baixa. Hoje temos trabalhadores mais qualificados e formalmente contratados. São, sem dúvidas, dados positivos que expressam também o fato de termos também surfado em momentos muito bons da economia. Embora a economia tenha caído um pouco, temos conquistas permanentes — avalia Marco Tulio Zanini, professor da FGV/Ebape.

Apesar da melhora, Zanini chama a atenção para a baixa produtividade do trabalho no Brasil:

— É claro que ainda temos problema na formação, com uma massa de pessoas com baixa formação e excluídas do trabalho qualificado. Isso ainda existe e precisa ser observado, mas a meu ver temos um problema igualmente grave no Brasil: a baixa produtividade. E não é porque faltam bons profissionais. Temos muitos. O nosso problema é a incapacidade de coordenar o trabalho. Por que temos mais profissionais qualificados que a Finlândia, por exemplo, e menos registro de patente que aquele país? Por que temos uma baixa produção intelectual e uma baixa produção com valor agregado? A meu ver isso se explica não por falta de profissionais, mas por falta de coordenação do trabalho. Esse é um gargalo no Brasil.

Diretor-executivo do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), Manuel Thedin tem avaliação parecida. Ele lembra que a melhora nos níveis educacionais ainda não chegou para todos. Thedin ressalta que um percentual ainda elevado de jovens com até 14 anos está fora da escola e isso limita a sua capacidade de entrar no mercado de trabalho. O executivo do Iets acrescenta ainda que, entre os mais pobres, cerca de 70% da formalização do emprego têm relação com a melhora da economia no período, que ampliou o número de contratações.

— A educação é um fator importante para o aumento da produtividade. Se observamos os dados da última década, vemos que houve uma melhora nos níveis de formação da população como um todo, o que acabou se refletindo no perfil do trabalhador. Agora, o que aconteceu dos anos 70 para cá? A produtividade do trabalho no Brasil era semelhante à da Coreia; agora, a Coreia tem uma produtividade que é quase o dobro a do Brasil. Mesmo com a melhora na educação, hoje ainda temos um grande contingente de jovens fora do ensino médio. Ainda temos problemas estruturais graves.

Pela série da Pnad, o trabalhador passou a retardar mais a entrada no mercado de trabalho. Em 2001, 43% informaram ter começado a trabalhar entre 10 e 14 anos. Esse percentual caiu para 34% em 2013. Nesse mesmo período, a faixa daqueles que começaram a trabalhar entre 15 e 17 anos subiu de 21% para 28%. Esse tendência foi observada também entre aqueles que entraram no mercado de trabalho entre 18 e 19 anos. Eles representam apenas 9% no início da série. Em 2013, subiram para 16%. Embora prorrogue o início da vida profissional, o trabalhador brasileiro agora trabalha mais. Em 2001, apenas 9% estavam na faixa daqueles que dedicavam entre 40 a 44 horas por semana para o trabalho. Onze anos depois, esse percentual subiu para 18%.

 

O Globo

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