Franquias procuram arbitragem para acelerar solução de conflitos

FILIPE OLIVEIRA
DE SÃO PAULO

Com o objetivo de reduzir os anos de espera até uma decisão judicial, franqueadoras e franqueados estão buscando a arbitragem para solução de conflitos entre si.

O Caesp (Conselho de Arbitragem do Estado de São Paulo), apontada por especialistas como a principal câmara de arbitragem para o setor, resolveu 30 conflitos em 2014. Em 2013, foram 15 e no ano anterior, 18.

Neste modelo, a decisão é tomada por um árbitro escolhido pelas partes, em vez de um juiz. Normalmente, ocupam a função advogados com experiência no setor.

Com isso, garante-se que a discussão será decidida por alguém que conhece profundamente o assunto, afirma Ana Claudia Pastore, superintendente do Caesp.

Ela explica que o árbitro pode dar sua decisão após duas audiências, realizadas em um prazo de, em geral, oito meses. Não cabem recursos, o que impede que o processo se prolongue por muitos anos, afirma.

Os conflitos solucionados na arbitragem são sigilosos.

As custas processuais, contudo, são maiores. Na justiça comum, elas são 1% do valor da causa, na arbitragem, o percentual varia de acordo com o valor (entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões paga-se 4,5%, por exemplo).

Fernando Tardioli de Lima, diretor institucional da ABF (Associação Brasileira de Franchising), defende, contudo, que o custo maior é compensado pela maior velocidade, o que reduz os gastos com advogados.

CONTRATO

Com 11 artigos, a lei que rege o funcionamento das franquias (a nº 8955, de 1994) é pouco abrangente, segundo a advogada Ana Flávia Sandoval, do escritório AFMS Attorney & Counselor at Law.

Ela não traz detalhes sobre a relação entre franqueado e franqueador, mas descreve quais são os requisitos que devem estar contidos na Circular de Oferta, documento que contém as principais regras do negócio e que deve ser entregue ao franqueado com, no mínimo, dez dias de antecedência da assinatura.

Para que uma disputa seja levada à câmara arbitral, o contrato deve prever a arbitragem como principal forma de solução de conflitos ou as duas partes devem aceitar levar a discussão até ela.

Desde o surgimento do Caesp, em 1998, foram arbitrados cerca de 150 disputas envolvendo franquias. Na maioria delas, a rede exigia a cláusula de arbitragem, diz Pastore. A instituição não possui dados sobre o total de redes que possuem a previsão em contrato.

Elídio Biazini, 55, sócio da rede Didio Pizza, diz se arrepender de não ter incluído a arbitragem no contrato que tem com seus franqueados.

A primeira versão do texto continha a previsão, mas acabou deixando-a de lado por desconhecimento, diz.

Hoje sua empresa trava uma disputa que se arrasta por dois anos e meio com um franqueado que, segundo ele, alterou os padrões visuais da rede, como sua logomarca.

“Tenho custos para manter o processo com advogado. Mas isso é o de menos. Poderia ter uma nova loja operando no local, pagando royalties e mantendo a marca na região”, diz.

PARCIALIDADE

Angelo Agulha, vice-presidente do Sindicato de Franqueados do Estado de São Paulo, diz que a arbitragem pode beneficiar mais o franqueador que o dono da loja.

Em sua avaliação, as câmaras tendem a decidir as causas levando em conta apenas o cumprimento do contrato que, por definição, é escrito pelo primeiro para defender seus interesses.

É possível, por exemplo, que um franqueado tenha deixado de pagar royalties por ter entrado em uma rede que “vendeu uma ilusão” e estar sem condição financeira para pagar. Nesse caso, a justiça comum seria a mais indicada para uma decisão imparcial, afirma.

“Somos em parte favoráveis às câmaras por causa da celeridade. Mas, se é para ser usado quando as partes estão em acordo, porque deveria ser estabelecida como obrigação contratual?”

LITÍGIOS

Os motivos que mais levam franquias à Justiça são a falta de suporte da dona da marca ou a não disponibilização do contrato com o prazo de dez dias de antecedência exigido por lei, segundo advogados ouvidos pela Folha.

Já as franqueadoras buscam a Justiça, principalmente, por não pagamento de taxas (royalties e fundo de propaganda), descaracterização das lojas ou o não cumprimento de padrões listados na Circular de Oferta, documento que rege o negócio.

Não há uma estatística oficial sobre a quantidade de processos envolvendo franquias.

A ABF (Associação Brasileira de Franchising) diz apenas que o número de casos é baixo em relação ao total de unidades no país (125,6 mil).

Já o Sindifranqueados (sindicato que representa os franqueados de São Paulo) afirma que são dezenas de casos por dia.

Um dos maiores causadores de litígios, segundo Angelo Agulha, do Sindifranqueados, são redes que vendem unidades prometendo retorno financeiro garantido antes de operarem lojas próprias.

Esta situação pode mudar: projeto de lei de 2008, aprovado pela Câmara e que tramita em comissão do Senado, prevê que empresários que queiram iniciar uma franquia precisem de, pelo menos, um ano de atuação com a empresa no mercado.

BATE O MARTELO
Veja alguns casos que foram resolvidos pela arbitragem:

Daqui não saio

Caso: Franqueadora queria encerrar o contrato e vender o imóvel ocupado. O franqueado pediu preferência para adquirir o local, mas não comprou e atrapalhou a negociação com outros.
Resultado: Franqueada teve de pagar indenização.

Deixou na mão

Caso: Franqueada teve problemas para comprar matéria-prima do franqueador.
Resultado: O contrato foi rescindido, e a franqueada, indenizada.

Amigo e rival

Caso: Franqueadora decidiu vender roupas da mesma marca e mais baratas em uma loja no mesmo shopping onde ficava a franqueada.
Resultado: Franqueadora foi obrigada a restituir valores referentes ao estoque.

A culpa é de quem?

Caso: Franqueada parou de pagar pelas mercadorias, royalties e fundo de propaganda, alegando falta de apoio do franqueador.
Resultado: O contrato de franquia foi rescindido e o franqueado condenado a pagar dívidas e multa.

Fonte: Caesp

Folha de S.Paulo

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