Postado em 30/10/2017 – Fonte: Gazeta do Povo – PR – Por: Evandro Éboli e Fernando Jasper
Presidente da Câmara incluiu reforma tributária no rol de prioridades deste fim de ano no Congresso
Derrubada a segunda denúncia contra Michel Temer, a votação da reforma tributária está nos planos do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que a inclui no rol de prioridades deste fim de ano. Mas ele próprio julga a proposta do relator do assunto, Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), muito “ampla e complexa”. E vai pedir ao deputado tucano que dê uma enxugada no texto.
“Esse projeto é muito amplo. Muito complexo. Tem que focar numa parte dele e priorizar a simplificação do sistema tributário. Já seria um grande avanço. Como está, o sistema gera um custo para as empresas muito grande”, disse Maia na última quarta-feira (25), após a votação que garantiu Temer no cargo.
A reforma, que Hauly classifica de “reengenharia tributária e tecnológica”, busca simplificar a cobrança de impostos e redistribuir as competências de cada ente da federação, mas sem alterar o tamanho da carga de impostos nem as fatias de arrecadação que cabem à União, estados e municípios. Ao mexer principalmente na forma como são tributados os bens e serviços, essa reengenharia afeta os interesses e a quilométrica legislação das 27 unidades da federação e dos mais de 5 mil municípios do país.
LEIA TAMBÉM: País vai arrecadar mais sem elevar impostos, prevê relator
Além de tratar de um tema espinhoso, a reforma exige quórum qualificado. A reforma elaborada por Hauly passa pela aprovação de uma emenda à Constituição (PEC) e de oito projetos de lei. Mudar o texto constitucional exige aprovação de três quintos do Congresso, isto é, 308 deputados e 49 senadores, com dois turnos em cada Casa.
Mas Hauly diz ter apoio de 95% dos deputados. “O projeto acabou virando uma tábua de salvação no Congresso. Uma mudança grande é uma esperança imensa, mesmo que não entre em vigor logo.”
O deputado fez uma apresentação de duas horas para Rodrigo Maia. “Claro que é um volume grande de informações que você despeja. Causa grande impacto. Mas tenho feito isso no país inteiro e as pessoas estão assimilando e cientes da necessidade de mudar. Já devo ter falado para 30 mil pessoas”, diz o relator, que já fez mais de 110 palestras e 170 reuniões de trabalho em sua caravana pró-reforma.
Obstáculos
Para Hauly, a reforma precisa entrar na pauta até novembro. Depois, vêm as férias dos parlamentares e, no ano eleitoral de 2018, é pequena a chance de aprovação de matérias relevantes.
Se depender da base do governo, haverá problemas. Na votação da segunda denúncia, Temer teve apoio de 253 deputados, número que nem sequer forma maioria absoluta na Câmara.
Hauly não trabalha com essa lógica. Diz que a reforma tributária é suprapartidária e conta com o apoio até do PT, com quem vai se reunir nos próximos dias.
“A mudança que estamos propondo é para simplificar algo complexo mesmo. Além de colocar todos impostos e contribuições na mesma base, de forma simples, temos a tecnologia, nosso diferencial. E respeitamos a partilha, uma das preocupações das pessoas. Para não ter prejuízo de arrecadação para a União, estados e municípios”, afirma.
Ocorre que muitos estados não querem perder a autonomia que têm para definir alíquotas e bases de cálculo dos tributos – que, pelo projeto de Hauly, seriam uniformizadas. Para ficar num exemplo: no Paraná, governado pelo também tucano Beto Richa, o secretário da Fazenda, Mauro Ricardo Costa, é contra esse ponto da reforma.
Há resistência também entre os municípios. Dias atrás, a procuradora do município de Blumenau (SC), Cleide Pompermaier, assinou artigo em que classifica a reforma de inconstitucional, “porque ofende o princípio federativo”.
Por fim, e não menos importante, a Receita Federal pressionado o governo para aumentar as alíquotas do PIS/Cofins. O objetivo é recuperar a arrecadação perdida com a decisão do Supremo Tribunal Federal que retirou o ICMS da base de cálculo dos tributos.
Tecnologia
“Minha experiência de 30 anos me credencia a falar por que é muito simples o que estamos fazendo. Mais do que o Supersimples, que elaborei. A complexidade era muito grande. Agora, com a tecnologia disponível, o que não tinha anos atrás, com o on-line, é mais tranquilo”, garante o relator.
Como exemplo de simplificação, Hauly diz que cada empresa terá uma espécie de conta bancária ligada ao Fisco. “Toda entrada e saída de valores estará registrada, e o imposto será recolhido on-line. Vamos ter um controle eletrônico das bilhões de transações que ocorrem todo dia no Brasil.”
O relator afirmou que a implantação do sistema de controle eletrônico não irá se dar da noite para o dia e fala num prazo de até um ano. “É um bom prazo para testar o novo modelo. Que pode ir crescendo gradativamente. Mantém o velho e vai implantando o novo”, explica.
A transição completa para o novo modelo tributário, com menos impostos, será bem mais longa. Nos primeiros cinco anos, seriam discutidos e aprovados os novos critérios de partilha dos impostos, que entrariam em vigor a partir do sexto ano e seriam aplicados aos poucos por 15 ou 20 anos.
País vai arrecadar mais sem elevar impostos, prevê relator
A mudança mais significativa proposta na reforma tributária relatada pelo deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) está na tributação sobre o consumo. Inspirado no modelo europeu, ele propõe um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e um Imposto Seletivo, que substituiriam quase uma dezena de tributos que hoje são cobrados sobre mercadorias, serviços e operações financeiras, entre eles ICMS, ISS, IPI, PIS/Cofins, Cide e IOF. E não haveria cobrança de imposto sobre alimentos, remédios, exportações, máquinas e equipamentos.
Pela proposta, os impostos sobre propriedade (IPTU, IPVA, ITR, ITCMD e ITBI) seriam mantidos, mas com alíquotas iguais em todo o país. As contribuições sobre a Previdência não mudariam. A tributação sobre a renda, por fim, se resumiria a um imposto resultante da fusão de IR e CSLL.
A expectativa é de que, auxiliada por um sistema eletrônico integrado, a simplificação atraia para o mercado formal empresas que hoje estão à margem da tributação por causa do excesso de burocracia. Assim, o país arrecadaria mais sem elevar impostos.
Na teoria, a reforma facilita o cumprimento das chamadas obrigações acessórias, que hoje fazem as empresas brasileiras gastarem uma monstruosidade de tempo, dinheiro e recursos humanos para preencher formulários. O Banco Mundial estima que a papelada exija um esforço próximo de 2,6 mil horas por ano. A Receita Federal fala em 600 horas.
“A sonegação vai cair drasticamente”, prevê Hauly. O contencioso tributário – que hoje envolve causas estimadas em R$ 2 trilhões na esfera administrativa e judicial – também seria desestimulado, segundo ele.
Problema social
Para o deputado, o problema mais grave do sistema tributário brasileiro é social. Ao contrário do que ocorre em países desenvolvidos, no Brasil a carga é mais concentrada no consumo do que sobre renda e propriedade. Por isso, é regressiva: os pobres pagam proporcionalmente mais impostos do que os ricos.
“Países que escolheram tributar mais a renda e a propriedade são os que mais cresceram e distribuíram riqueza. Países que tributaram muito o consumo ficaram para trás”, diz Hauly.
Por isso, o relator da reforma defende que a carga seja gradualmente deslocada do consumo para a renda e a propriedade, aproximando o Brasil da realidade dos países desenvolvidos. Mas hoje a minuta do projeto não prevê um aumento do Imposto de Renda. “Não haverá aumento, a não ser que seja negociado”, diz.
Num primeiro momento, a carga sobre os mais pobres cairia em função do barateamento dos produtos – porque, com a simplificação, as empresas teriam menos custos – e da isenção de impostos sobre alimentos e remédios, que consomem boa parte do orçamento das famílias de baixa renda.